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LIMITAÇÕES NAS REDES ELÉTRICAS

Nos confins do Estado, certos horários são proibidos para o banho. É que se um vizinho liga o chuveiro, o outro pode não conseguir terminar de ordenhar as vacas, porque a rede não suporta a carga.

Embora seja o terceiro colocado no ranking nacional de cobertura elétrica no campo, o Rio Grande do Sul tem 250 mil pequenas e médias propriedades — metade do total, estima o setor — que encontram na qualidade da energia um entrave para a expansão e modernização. Baixa potência, fornecimento precário e falta de manutenção são ingredientes que, somados, causam um apagão de desenvolvimento.

Levantamento da Secretaria de Minas e Energia mostra que, dos 161 quilômetros de rede rural, 53% são monofásicas. E os custos para alterar a carga, que cabem ao produtor, muitas vezes inviabilizam a compra de aparelhos mais potentes. Cálculos da secretaria indicam que seria necessário investir R$ 1,6 bilhão para transformar
todas as cargas em trifásicas.

— Muitos gostariam de modernizar, mas a energia é limitante. Não adianta fazer planos se a estrutura não é capaz — avalia o assessor de política agrícola da Federação dos Trabalhadores na Agricultura no Estado (Fetag-RS), Márcio Langer.

É o caso de Gibrair e Juciane Vichnowski, de Erechim. A família queria construir mais um aviário, mas as constantes quedas de energia e o fato de a rede cruzar a propriedade travam a obra. Embora tenha carga trifásica, a casa ficou no escuro, em média, três vezes por semana só no mês passado.

Juciane disse ter avisado várias vezes a RGE de que os postes podiam tombar. Em janeiro, um temporal os fez cair em efeito dominó, e a saída foi alugar um gerador. Como 2,5 mil aves morreram, a produtora busca na Justiça ressarcimento pelo prejuízo de R$ 10 mil:

— A rede é muito antiga – afirmou Juciane.

Em nota, a RGE informou que faltou energia por 23 horas na propriedade devido à grande demanda de atendimentos emergenciais. Sobre a retirada de rede, informou já ter programado vistoria no local para identificar as ações cabíveis.

Propostas ainda no papel

Diretor da Federação da Agricultura do Estado (Farsul), Fábio Avancini Rodrigues diz que o problema não está só no tipo de rede, mas na distribuição, o que resulta em produtividade menor, em especial no arroz (100% irrigado), e perdas na produção avícola e leiteira. Para Rodrigues, a solução passa por investimento e mais ação dos órgãos reguladores:

— Energia é insumo de produção. No grão, quilo de carne ou litro de leite, a energia é um componente, como adubo ou terra. E se tem deficiência em uma parte, há quebra na produção – disse ele.

A falta de energia estável e de qualidade pode agravar ainda mais o êxodo rural, além de ser empecilho para diversificar a produção, alerta o presidente do Sistema Ocergs/Sescoop, Vergilio Perius.

— Se não houver energia forte, teremos um problema social muito grave, porque as pequenas propriedades vão ser absorvidas pelas grandes, que têm energia — avalia. 

Uma das saídas, segundo ele, seria a criação de uma linha de crédito acessível para que os produtores pudessem alterar a carga das propriedades, o que requer investimentos de R$ 15 mil a R$ 50 mil.

A Secretaria de Minas e Energia está mapeando as necessidades por região. Segundo o secretário Lucas Redecker, um projeto para buscar verba, via financiamento externo, deve ficar pronto em até 60 dias. O foco é transformar redes monofásicas e bifásicas em trifásicas. Uma das opções de fonte de recursos seria o Banco Mundial.

— Ainda estamos discutindo, mas o produtor e o Estado devem ter contrapartida — frisa o secretário.

Proposta semelhante, que prevê investimentos de União, Estado, empresas e produtores, foi levada ao Ministério de Minas e Energia  pela Comissão da Agricultura da Assembleia, que debaterá o tema na segunda-feira. Diretor de Gestão do Setor Elétrico da pasta, Marcos Franco Moreira diz que o pedido está em análise e que um grupo de trabalho deve ser criado.

Promessa de mais recursos

Concessionárias e cooperativas permissionárias planejam investir neste ano pelo menos R$ 220,9 milhões na melhoria da qualidade de energia no campo –—16,6% a mais do que o desembolsado em 2014.

O maior valor deve ser aplicado pelas 15 cooperativas associadas à Federação das Cooperativas de Energia, Telefonia e Desenvolvimento Rural do Estado (Fecoergs): R$ 90 milhões, 12,5% a mais do que no ano passado. O superintendente, José Zordan, diz que estão previstas obras como melhorias e construção de redes, troca de transformadores e construção de subestações. A AES Sul pretende investir R$ 85 milhões (4,9% a mais do que em 2014), e a CEEE, R$ 45,9 milhões (alta de 61,6% comparado ao ano anterior). Procurada, a RGE não informou sua previsão.

Para o gerente de energia elétrica da Agência Estadual de Regulação dos Serviços Públicos Delegados do RS (Agergs), Nilton Telichevesky, o problema é que a demanda rural cresceu e os investimentos não acompanharam:

—  O Estado praticamente atingiu a universalização na área rural, mas com o conceito de levar a luz e não energia. As pessoas se satisfaziam em ter lâmpadas e eletrodomésticos, mas hoje a demanda cresceu.

Ele explica que, até 2010, se um produtor precisasse fazer uma obra para melhorar o fornecimento, teria participação de 90%. Desde então, obras para quem consome até 50 kw viraram responsabilidade das concessionárias, exceto se for preciso troca de fase (de monofásico para bifásico, por exemplo).

A Agergs sugere que os produtores de uma mesma localidade se unam e peçam aumento de carga alegando que isso resultará na “expansão do setor elétrico” — investimento previsto nos contratos de concessão como responsabilidade da empresa, que será ressarcida depois.

Se o pedido for negado, a Agergs promete ajudar na negociação. O gerente admite, porém, que a  falta de pessoal desafia a  associação, que tem apenas 30 dos 66 funcionários de nível superior previstos na lei que a criou.

Fonte: Zero Hora



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