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AUTODECLARAÇÃO PODEM REGULARIZAR TERRAS

O governo federal está preparando uma medida provisória para regularizar terras com base na autodeclaração. Especialistas alertam para os riscos dessa decisão.

O Brasil tem 18 cadastros fundiários, de acordo com um estudo recente coordenado pela Escola Superior de Agricultura da Universidade de São Paulo. E os registros não batem. Cerca de 17% do território brasileiro não estão em nenhuma base de dados. Em outras palavras, ninguém sabe quem são os donos.

Há também sobreposição de fazendas com terras indígenas, com áreas de proteção ambiental ou com terras públicas. Das cerca de 6 milhões de propriedades rurais, pelo menos 700 mil não têm escritura. Especialistas calculam que, só na Amazônia, 32 milhões de hectares estão em situação indefinida.

Esse caos fundiário vem abrindo espaço para invasão de terras públicas e grilagem, violência e desmatamento. Para enfrentar isso, o governo fala em novo processo de regularização fundiária, só que com base em autodeclaração. O interessado é que vai dizer onde exatamente é a propriedade, qual o tamanho e há quanto tempo ocupa a área. O governo diz que pretende entregar o título da propriedade depois de verificar as informações.

O secretário de Assuntos Fundiários do Ministério da Agricultura diz que não há como bater de porta em porta no campo para fiscalizar. Nabhan Garcia defende que a autodeclaração, com ajuda da tecnologia, como imagens de satélite, é segura.

“A imagem satélite não mente. Não tem como fugir da tecnologia. Nós vamos voltar no tempo? Nós vamos voltar no tempo que media terra com corrente? Se nós temos uma tecnologia que nos ajuda em todos os sentidos, então vamos usar dessa tecnologia. Se ele cometer uma fraude, uma mentira nessa declaração, ele já perde imediatamente a sua propriedade”, destaca Nabhan Garcia, secretário de Assuntos Fundiários do Ministério da Agricultura.

Mas a especialista Brenda Brito, do Imazon, alerta que a autodeclaração não deu certo no passado: “historicamente, toda tentativa de se fazer um registro de terra com base em autodeclaração, no Brasil, ele foi um fracasso e levou a mais prejuízo e conflitos agrários no campo, porque o governo nunca tem essa capacidade de verificar o que está sendo declarado, e esses documentos acabam sendo usados para vender terra ou ser registrados. E isso cria, sim, conflito em campo”.

Um exemplo de experiência malsucedida é o Cadastro Ambiental Rural criado em 2014. Das 6 milhões de autodeclarações, até agora, só 3% foram verificadas pelos governos estaduais.

Uma nota técnica de pesquisadores sobre a medida provisória do governo afirma que “qualquer instrumento simples e flexível de cadastro autodeclarado sobre os limites de propriedades precisa ser acompanhado de um robusto e sofisticado sistema técnico para a sua validação. Este exige um alto grau de automação, combinado com uma equipe técnica e analítica de alto nível e em quantidade suficiente”.

O estudo conclui que “não há conhecimento que tal estrutura de sistemas e pessoal esteja disponível na escala necessária para enfrentar a complexidade da situação fundiária brasileira”.

O professor Gerd Sparovek, da USP, que participou do estudo, diz que o caminho da autodeclaração, ao contrário do que o governo defende, pode incentivar a grilagem de terras: “o maior risco de uma regularização fundiária, que é a transferência de terras que hoje são públicas para o setor privado, com a autodeclaração, é a gente fomentar, com isso, a grilagem de terras. Pessoas que não são detentores legítimos daquele direito passarem a utilizar a facilidade da autodeclaração como uma forma de apropriação indevida dessas terras”.

Fonte: G1



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