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TECNOLOGIA FLORIDA

Em pleno inverno úmido e chuvoso, gérberas, boca-de-leão, eustoma, tango e mosquitinho florescem na colônia japonesa do Vale do Sinos. Em uma área de cinco hectares, em Dois Irmãos, a família Ban produz variedades de corte o ano todo para atender o mercado do Rio Grande do Sul, o terceiro maior consumidor de flores do país.

Há menos de cinco anos, a produção da Floricultura Florist nos meses frios era quase nula. Com investimento em estufas, manejo e variedades mais adaptadas a mudanças climáticas, o produtor Yuuki Ban, 34 anos, conseguiu manter a produção no outono e no inverno – período em que a falta de luminosidade prejudica o cultivo.

As técnicas permitiram que a floricultura dobrasse a produção desde 2010, chegando a 300 mil pacotes por ano – cada um com até 20 hastes.

– Foram muitas tentativas com erros e acertos. O desafio era plantar e colher o ano todo, aumentando a produtividade na mesma área – diz o produtor, formado em Administração, que comanda a Florist ao lado do pai, Hikaru, e da mãe, Harumi.

Imigrantes japoneses, Hikaru e Harumi chegaram ao Brasil na década de 1970, quando passaram a investir em hortaliças e frutas. Nos anos 80, focaram a produção exclusivamente em flores e folhagens – atividade comum entre as famílias que formam a colônia japonesa no Vale do Sinos.

Mapeamento do setor é um dos focos

Com a produção protegida do vento e da chuva em estufas, a Florist usa irrigação por gotejamento – técnica israelense onde a água é aplicada em gotas diretamente ao solo. No inverno, as flores recebem iluminação noturna artificial para compensar a falta de luminosidade durante o dia.

– Ao conseguir produzir flores tanto no inverno quanto no verão, nós dobramos o nosso faturamento nos últimos cinco anos. Ainda nos falta a calefação para controlar as estufas nos dias de temperaturas extremas – frisa Ban, planejando o investimento futuro.

Ao manter a produção nos meses frios, os floricultores gaúchos conseguem atenuar um dos principais limitadores do cultivo: a instabilidade climática, que faz com que o RS tenha de importar mais de 70% das flores de corte de outros Estados, conforme a Emater, especialmente de São Paulo.

– A floricultura exige mão de obra qualificada, trazendo tecnologia e renda para o produtor com plantio em áreas pequenas. Mas temos poucos produtores em grande escala. Além dos problemas climáticos, não dispomos de uma central de comercialização que permita o  floricultor dedicar-se apenas à produção, também ficando responsável pela logística do negócio – compara Clarice Simm, presidente da Associação Riograndense de Floricultura (Aflori) e da Comissão de Floricultura da Federação da Agricultura no Rio Grande do Sul (Farsul).

Clarice lamenta, ainda, que o setor não tenha estatísticas tão detalhadas sobre o número de produtores e a área cultivada. As informações mais recentes, levantadas pelo Instituto Brasileiro de Floricultura (Ibraflor), põe o Estado como o quarto maior em faturamento e o segundo com mais produtores no país.

– Estamos trabalhando com a Emater para que um levantamento seja feito. Assim, poderemos saber quem e quantos somos – destaca Clarice.

Expansão em diferentes polos

Embora produtores de flor estejam espalhados por todo o Rio Grande do Sul, os principais polos de produção estão no Vale do Sinos e na Região das Hortênsias. Em Dois Irmãos e Ivoti, cerca de 40 famílias japonesas dominam a produção em viveiros de mudas e de variedades de corte.

Em Pareci Novo, a produção divide espaço com frutas e plantas nativas. Perto dali, em Nova Petrópolis, uma das maiores floriculturas gaúchas produz 1,5 mil variedades de plantas ornamentais, abastecendo grandes redes de supermercado e fornecendo sementes e mudas a produtores. Ainda há polos em Vacaria, Santa Cruz do Sul e Pelotas.

– Mas ainda não somos autossuficientes na produção, importando boa parte do que consumimos. Isso mostra que temos um potencial enorme para crescer – avalia o agrônomo Laerte Correa Silva, diretor de ensino, pesquisa e extensão da Associação Riograndense de Floricultura (Aflori) e técnico recém aposentado da Emater.

E a busca por crescer cada vez mais terá um momento importante na próxima quinta-feira, quando representantes do setor estarão reunidos em Ivoti para o 2º Encontro Estadual de Floricultura. O evento terá a participação do holandês Andreas Petrus van Kruijssen, presidente da Veiling Holambra, cooperativa paulista responsável por 45% do comércio nacional de flores.

Cores ditam desde plantio até consumo

Não é somente o clima que desafia os floricultores gaúchos a adaptar a produção. No Estado onde o consumo é influenciado pela descendência europeia da população, as tendências de cores a cada ano ditam a escolha das sementes nos viveiros. Usadas para enfeitar ambientes em casamentos, festas de formatura e outros eventos, as flores de corte buscadas pelos consumidores mudam conforme as criações de moda, beleza e decoração.

– Teve épocas em que o roxo, o lilás e o nude lideraram a preferência. Neste ano, a cor da moda é a marsala, parecida com um bordô – diz Yuuki Ban, acrescentando que é muito importante o produtor acompanhar as tendências de mercado para definir prioridades e garantir bons negócios.

O comportamento das consumidoras também é observado pelos floricultores. Mulheres que gostam de cores intensas, como o vermelho, por exemplos, são as que trocam mais frequentemente as flores de jardim, afirma Satoshi Suzuki, produtor em Ivoti, no Vale do Sinos:

– Por isso, tenho sempre 20% a mais de cores vermelhas – destaca Suzuki.

Sementes são importadas da Europa e da Ásia

As sementes que dão origem às flores produzidas no Rio Grande do Sul são, em grande parte, trazidas da Europa e da Ásia. Países como Holanda, Japão e Israel são responsáveis pelo melhoramento genético de variedades cultivadas no mundo todo.

Produtora de 1,5 mil variedades de plantas ornamentais, a Floricultura Úrsula, com sede em Nova Petrópolis, na Serra, importa a maioria das sementes que resultam em mudas pré-cultivadas fornecidas a produtores espalhados por toda a região sul do país.

– Os maiores melhoristas de sementes de flores não fazem o trabalho genético no Brasil, onde ainda falta incentivo para o desenvolvimento de pesquisas na área – afirma Christine Hesse Gross, uma das sócias da Floricultura Úrsula, fundada na década de 1960.

Com mais de 50 hectares cultivados, a empresa produz plantas ornamentais o ano todo, entre flores da estação, arbustos e folhagens para jardinagem. Nas estufas, usam ar quente durante o inverno. A produção é vendida em três lojas próprias, para floriculturas e grandes redes de supermercado da região metropolitana, como BIG e Nacional.

– Alternamos o cultivo de variedades conforme a estação. Há garantia de oferta o ano inteiro para atender o mercado – completa Christine.

Produtor de mudas de flores e hortaliças em Ivoti, no Vale do Sinos, Satoshi Suzuki escolhe a dedo as sementes para cultivar na área de 1,5 hectares.

– A qualidade da semente influencia na produção. As híbridas produzem flores maiores, compactas e que duram mais tempo – aponta Suzuki, que produz em torno de 50 mil mudas por mês, entre flores e hortaliças.

Além da semente, Suzuki atribui à utilização de substrato da turfa o resultado da produção. Importada do Canadá, a substância é formada pela decomposição de vegetais acumulados em terrenos alagadiços. O produtor completa o tripé de qualidade na produção com a busca incessante por eficiência da mão de obra de quem trabalha nos viveiros.

– O carinho e dedicação no dia a dia são importantes também. A energia das pessoas faz com que as plantas floresçam – completa.

Logística ainda desafia o Estado

Diferentemente de São Paulo, que dispõe de centrais de distribuição de flores para todo o país, o Rio Grande do Sul tem na logística um dos principais desafios para alavancar os negócios.

Além de cuidar da produção, os floricultores gaúchos são responsáveis também pela distribuição e comercialização dos produtos. Boa parte dos viveiros tem frota própria para entregar as plantas em pontos de vendas.

– Em São Paulo, os produtores conseguem trabalhar com produtos específicos, sem se envolver com distribuição. É mais fácil de ter maior escala dessa forma – compara Clarice Simm, presidente da Associação Riograndense de Floricultura (Aflori).

Ela recomenda investimentos em floricultura em núcleos de produção, próximo de polos consumidores.

– O ideal é não estar sozinho na produção e, claro, conhecer o mercado. A flor não é uma commodity, é preciso plantar sabendo para quem irá vender  – acrescenta.

Fonte: Zero Hora

 



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