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Três anos depois, produtores rurais ainda esperam para receber da Seara

Em abril de 2017, o produtor rural
Anselmo Bernardelli, do município de Santa Mariana, no Norte Pioneiro do Estado,
foi pego de surpresa. A empresa para a qual ele vendia soja, a Seara Indústria
e Comércio de Produtos Agropecuários, com sede em Sertanópolis, no Norte do
Paraná, entrou com um pedido de recuperação judicial, como forma de evitar a
falência. Do dia para a noite, Bernardelli e outros mais de 1,1 mil
agricultores que forneciam produtos, principalmente soja, à Seara ficaram sem
receber, embora já tivessem entregado sacas e mais sacas à empresa. Hoje, mais
de três anos depois, os produtores ainda não viram a cor do dinheiro. A dívida
passa dos R$ 83 milhões.

“Foi um alvoroço. Eles mantinham um
entreposto em Santa Mariana. O gerente chamou todo mundo lá, falando que a
empresa tinha entrado em recuperação judicial. Foi um bafafá. A promessa era pagarem
em 90 dias, mas, até agora, nada”, diz Bernardelli, que hoje é presidente do
Sindicato Rural de Santa Mariana. Só ele tem quase 6,4 mil sacas para receber
da Seara. Outros 48 produtores do município também levaram o que chamam de
“calote”.

Com uma dívida total estipulada em R$
2,7 bilhões, a Seara teve seu plano de recuperação judicial aprovado pelos
credores em assembleia realizada em Londrina, Norte do Paraná, em fevereiro do
ano passado – mais de um ano passado depois de a empresa ter entrado com
pedido. Os credores foram divididos em quatro classes, ordenadas de acordo com
os critérios da Lei 11.101 de 2005. Conforme a norma, a empresa deve quitar as
dívidas em cada uma das classes, seguindo a ordem de prioridade (veja o quadro
abaixo).

O advogado da Seara Bruno Pirog
Stasiak explica que as dívidas com credores da Classe I (funcionários ou
ex-funcionários com pendências trabalhistas) já foram praticamente todas
quitadas. “Do quadro de credores inscritos no momento da aprovação do plano,
está praticamente solucionado. Os que tinham créditos até um limite de R$ 15
mil receberam em uma única parcela. O restante foi pago em nove parcelas”, diz
o advogado. “Tem alguns credores que se habilitaram posteriormente e que têm o
processo ainda tramitando”, acrescenta.

Em relação à Classe II (credores com
garantias reais, entre os quais, bancos e instituições financeiras), a quitação
também se encaminha para uma solução. Segundo Stasiak, quatro terminais da
Seara serão repassados aos credores, como forma de cobrir a dívida. Para
viabilizar a transferência dos ativos, foram formalizadas quatro empresas. “Da
transferência dos quatro terminais, dois já estão em fase final”, aponta o
advogado.

Produtores
rurais

Com isso, aumentam as perspectivas de
que os produtores rurais – parte da Classe III – possam receber em breve.
Segundo o advogado, nas próximas semanas a empresa deve publicar um edital de
venda de ativos para pagar esse grupo. Entre os ativos estão caminhões,
terrenos em diversos municípios e uma fazenda. Os bens estão conjuntamente
avaliados em R$ 83 milhões – valor integral da dívida – e não poderão ser
vendidos abaixo do preço mínimo da avaliação.

“Se os ativos não serem vendidos, ocorre
a íntegra [repasse] dos bens aos produtores para que eles determinem o que se
fazer para saldar a dívida. Essa possibilidade foi colocada pelos próprios
produtores, em assembleia”, explica Stasiak.

A Seara também começou a quitar os débitos
com os credores da Classe IV (pequenas e microempresas). Segundo o advogado, já
foram pagos os créditos a quem tinha até R$ 15 mil para receber. “Os demais serão
pagos nos próximos meses, de acordo com o estabelecido no plano”, resume o
advogado.

Produtores
classificam o caso como “golpe”, “calote” e “roubo”

Em Bela Vista do Paraíso, no Norte do
Paraná, o produtor rural João Dimas Pozzobon também espera avidamente pelo
dinheiro. Mas, além do atraso, ele reclama da falta de informações em relação
ao plano de pagamento. Ele tem por receber o equivalente a 2050 sacas de soja,
que havia entregue à Seara antes do pedido de recuperação judicial. “Nas
regiões Norte e Norte Pioneiro, foi uma derrocada. Muitos produtores entregaram
tudo o que produziram e não receberam. Muitas famílias foram à ruína. Hoje, a
gente não consegue ter uma posição. Ninguém diz nada”, ressalta Pozzobon. “Foi
o maior calote da região”, acrescenta.

Para o agricultor Anselmo Bernardelli,
a Seara atraiu os produtores rurais da região para um golpe. A empresa costumava
pagar entre R$ 1 e R$ 2 a mais que as cooperativas, por saca de soja. Em geral,
o pagamento era feito em cerca de três dias após a entrega do produto nos
entrepostos. Com o subido processo de recuperação judicial, centenas de
produtores perderam a soja que haviam repassado à empresa.

“Nós fomos confiando. Só em Santa
Mariana, 49 produtores foram lesados. Eu, mesmo, tinha recibo-depósito que, com
a recuperação judicial, passou a não ter validade. O Sindicato Rural deu a mão
para todo mundo, mas teve produtor que ficou doente, que se desestruturou
completamente. Foi mais que um golpe: foi um roubo”, declara Bernardelli, que precisou
pagar o custeio da safra sem ter recebido. “Eu usei algumas reservas e fui
liquidando aos poucos as dívidas do custeio daquela safra. Ainda falta uma
parcela”, diz. “Mas, muitos agricultores tiveram que recorrer a dívidas ou
quebraram”, complementa.

Além disso, na ocasião da aprovação do
plano de recuperação judicial, foi aprovado que os produtores receberiam entre
R$ 52 a R$ 54 por saca de soja entregue. Apesar do atraso do pagamento, o valor
não foi corrigido. No mês de maio, em alguns dias, a saca de soja estava cotada
acima dos R$ 100 no mercado físico do Paraná.

Veja as classes de credores da Seara e o que cada uma tem por receber:

Classe
I
– Funcionários e ex-funcionários com
pendências trabalhistas

R$ 2,2 milhões

0,10% do total da dívida

Classe
II
– Credores com garantia real (como bancos e
instituições financeiras)

R$ 1,2 bilhão

47,10% da dívida

Classe
III
– Credores sem privilégios específicos (entre
os quais, produtores rurais)

R$ 1,4 bilhão –> R$ 83 milhões, a
produtores rurais

52,70% da dívida

Classe
IV
– Micro e pequenas empresas

R$ 2,2 milhões

0,10% da dívida

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Fonte: Sistema FAEP



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